DOMINGOS 78 E PAULO JOSÉ 77 – MAIS DE MEIO SÉCULO DE AMIZADE.
Neste sábado,
DOMINGOS ficou um ano mais velho do que eu. Tem sido assim desde 1963.
Em 20 de março de
63 eu completava 25 anos de vida. Conheci Domingos, que também tinha 25 anos. Tínhamos
a mesma idade, os mesmos sonhos, as mesmas inquietações. Mas com certas
diferenças também.
Domingos era o
carioca descolado, cheio de meninas à sua volta, comandando a noite de Ipanema,
do Zepelim, do Veloso, do Castelinho até o Mario’s Inn em Copa.
Domingos era
o fodão do Bairro Peixoto! (É onde nosso herói morava).
Eu chegava de
São Paulo para fazer “A Mandrágora” de Machiavelli no Teatro Santa Rosa, onde acampamos,
eu e o Teatro de Arena, por dois meses. A peça era um sucesso e era natural que
as meninas andassem à minha volta, e à volta delas rapaces* (rapazes) sempre
prontos para uma mordida. * rapace – adj. - diz-se
das aves de rapina.
Domingos comandava
a banda com seu ar de poeta romântico, cravo na lapela, sapato bicolor, terno
de linho, gravata borboleta, sempre a
indicar, decidido, a Via Láctea, isto é, o caminho da noite. Atrás dele o já
proclamado bando de garotas e eu, que logo fui incorporado a ele, o bando. Devo
dizer a vocês que tinha mulher bonita para todos os gostos.
(Isto
vai dito quase como um segredo. As feias
que me perdoem mas beleza é fundamental.
Apenas para quem foi íntimo, vai aqui um breve
memorando de garotas que floriam o jardim da praia de Ipanema: Dorinha do Ruy,
Glorinha, Solanginha, Aninha do Cecil, Marieta do Gaucho, Leila, Tânia, Ionita,
Gladys, e muitas, muitas outras.
Não me estenderei em maiores
detalhes em nome do silêncio tácito que devem ter os rapazes. As meninas se
oferecem de bom grado e prazer a quem não conta vantagens, os amigos coloridos,
tão íntimos e discretos quanto primos(as) e cunhados(as). Assim como
hoje se “fica”, naqueles dias felizes muito se “ficava”, principalmente quem
tinha um apartamento próprio ou podia usar o ap de um amigo. Domingos tinha uma
cobertura no Bairro Peixoto, podia dar grandes festas, “o que um sorriso tem que outro não tem?”, as meninas chegavam e
partiam, as que ficaram viraram amigas e junto com os amigos alegram as noites
aniversárias até hoje, dia 27 de setembro de 2014. Tem gente que está na conta
dos amigos há mais de 50 anos.
Esta é uma
data que se repete todo ano, dia 28 de setembro, dia de DOMINGOS 78 (este ano) que vem fazendo da vida um sarau
literário-filosófico, driblando as dificuldades, sempre com uma surpreendente
produção de mais uma peça, um romance, mais um filme, que não dá para parar!
Que venham
outros saraus filosóficos, outras festas domingueiras!
Sucesso para
“INFÂNCIA”, um autêntico filme do Mingão. E que ninguém me apareça afirmando
que Domingos é o Woody Allen brasileiro. Daqui do alto da Gávea eu vos afirmo
que DOMINGOS OLIVEIRA não é o Woody Allen brasileiro!
Tá certo, eu
também gosto do Woody Allen, a comparação do Domingos com ele pode ser até um
elogio, mas ignora o que o brasileiro tem de original. Como Woody Allen,
Domingos tem um humor muito particular, expressando-se através de uma câmera
que se movimenta com muita liberdade, em planos longos, dando mais
importância ao jogo dos atores,
espontaneamente bem ensaiados do que à construção formal da imagem. Domingos e
Woody Allen, um novaiorquino e o outro carioca, fazem parte da mesma família de
dramaturgos e cineastas. Mas o primeiro, nos anos sessenta, já fazia um cinema
que Woody Allen só começaria a fazer bem mais tarde. Quando um já filmava
“Todas as Mulheres do Mundo”, em 1965, o outro escrevia seu primeiro roteiro
“What’s New Pussycat” (“O Que Há de Novo, Gatinha?”) que teve Peter Sellers no
papel principal e Allen como coadjuvante. E somente depois de “Edu, Coração de
Ouro” (1966) e “ As Duas Faces da Moeda” (1967), somente em 69, o americano dirigia
seu primeiro filme, “Take the Money and Run” (“Pegue o Dinheiro e Corra”),
tendo no mesmo ano estreado no teatro sua comédia “Play it Again, Sam” (“Toca-a
outra vez, Samuel”, em tradução literal portuguesa), transformada em filme na
década seguinte, em 1972, aqui exibido como “Sonhos de um Sedutor”.
E como se não
bastasse essa comparação, aparece-nos outro autor que Domingos parece imitar: Lars
Von Trier e seu Dogma 95. Acontece que o Dogma só apareceu em 1995 e Dogmingos
faz cinema com liberdade, cenários naturais, câmera na mão desde 1965, ou seja,
trinta anos antes.
É o mesmo que dizer que Domingos segue os
preceitos do Dogma 95 (de 1995) desde 1965!...
Se for para fazer aproximações é mais correto aproximar nosso
cinema dos anos 60 do cinema francês desse mesmo período, Godard e seu “A Bout de Souffle”
principalmente e a Nouvelle Vague de um modo geral. Lá e cá a utilização de
câmeras leves, até então exclusividade do cinema-reportagem, permitiram uma nova linguagem, dando
preferência aos ambientes naturais no lugar dos cenários de estúdio,
planos-sequência, iluminação com pouca ]uz artificial, improvisações, etc. Essa
liberdade é que fez com que “Todas as Mulheres do Mundo”, previsto para ser um
filme de média-metragem tenha se
tornado um longa-metragem,
o primeiro filme com a marca registrada de Domingos que manteria seu estilo
pessoal até o recente “INFÂNCIA”.
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O filme “INFÂNCIA” tem roteiro e direção do próprio Domingos
baseado na sua peça “ASSUNTO DE
FAMÍLIA”, ou “DO FUNDO DO LAGO ESCURO”, um texto da melhor qualidade, saboroso, inteligente e
carregado de afeto, como tudo o que Domingos faz. A primeira montagem foi em
1977 no Teatro Ginástico, no Rio de Janeiro, com Fernanda Montenegro
encabeçando o elenco, em espetáculo dirigido por mim. “ASSUNTO DE FAMÍLIA” teve
uma segunda montagem em 2010, no Teatro Clara Nunes com Domingos como diretor e
ator fazendo D. Mocinha, a matriarca da família, com boa parte do elenco que
viria a fazer o filme em 2013.
A grande vantagem de “INFÂNCIA” é que o trabalho dos atores vem aprofundado pela
longa experiência que tiveram nas montagens teatrais, o que permitiu ao
Domingos filmar planos longos, cenas inteiras com poucos cortes, dando ao filme
um caráter quase documental, como se fossem pedaços de vida captados
espontaneamente, num ritmo ágil e irresistivelmente comunicativo. “INFÂNCIA” é
emocionante e divertido, engraçado e apaixonante.
Cotação:
Imperdível.
PAULO JOSÉ
04 - outubro – 2014.